O BOM HUMOR
Certo dia acordei de muito bom humor e decidi fotografar logo cedo, nem tomei café da manhã e saí pela rua sem destino. Encontrei uma senhora baixinha e magrinha, de pele preta, bem arrumada e com uma expressão alegre na rua. Eu estava de longe e resolvi que ia registrá-la. Meu bom humor encontrou com o dela, quando ela me notou ali já enquadrando a foto, eu tirei o olho da câmera, olhei pra ela e sorrindo apontei pra câmera e fiz um sinal de positivo com o polegar. Uma linguagem muda e bem clara do meu pedido. Ela inclinou a cabeça dizendo que sim e abriu um sorriso enorme banguela. Aquilo mudou totalmente a foto que eu tinha planejado fazer. Meu bom humor multiplicou em 1000 vezes. Não que eu estivesse rindo da falta do dente, mas a alegria dela se misturou com a minha. A foto que eu planejei fazer antes seria bem mais séria e o bom humor mudou tudo!
Fotografar é solitário
Ao longo dos anos, após tantos ensaios, o fotógrafo começa a perceber que sua profissão é bastante solitária, claro que nem sempre isso é negativo. Ao olhar pelo oclusor da câmera você se transporta momentaneamente para uma mini sala de cinema, retangular, preta, e você observa sozinho nessa sala o que se passa na tela. Isto lhe traz algum poder, porque ao invés de simplesmente assistir as cenas, você as comanda também.
a decisão de fazer uma foto normalmente leva tempo, seja no ato, ou anos antes, enquanto se estudava, testava, treinava e errava. E esta decisão de fazer uma foto também é solitária, ainda que tenha sido encomendada por um cliente, o fotógrafo determina, no final de tudo, como vai ser.
Fotografar em grupo pode ser divertido e enriquecedor, você aprende muito e ensina também, trocando dicas e observando os outros fotografando, mas uma vantagem de fotografar sozinho é ter liberdade de escolher tempo. Muitas vezes temos que esperar vários minutos ou horas para registrar um instante e tornar real aquilo que você planejou mentalmente, outra vez solitário. Você troca horas por 1/160 de segundo para registrar o que a semiótica de Barthes vai chamar de "punctum". Você se torna um trocador de tempo.
O olhar do fotógrafo
Uma vez fui passear com minha amiga Brenda e suas duas irmãs menores num parque, que fica na orla de Salvador. Fizemos algumas fotos com o celular mesmo e fomos andando explorando o lugar. Elas foram andando na frente e enquanto eu caminhava e pensava na vida, olhei pro chão e vi uma plantinha que eu conhecia desde criança com o nome de Maria-fecha-a-porta, não sei o nome científico, mas é aquela que você toca na folha e ela se fecha. Parei, agachei fiquei ali brincando. As meninas ficaram curiosas com o que eu via e voltaram. A menorzinha apenas tocou e já viu como funcionava, a do meio perguntou o que era, ficou olhando e depois tocou também. Minha amiga perguntou como eu tinha enxergado aquela plantinha ali no meio de tanta coisa. Eu respondi que foi o olhar do fotógrafo.
a irritabilidade
Chame qualquer fotógrafo profissional e pergunte: "O que te irrita?" Ele poderá responder que são as perguntas ou comentários infames: "Mas não é só apertar um botão?", "Com uma câmera dessa até eu!", "Pode mandar pra mim assim mesmo, nem precisa editar", ou ainda "Que caro, meu primo faz foto com o iPhone e saem lindas, ele cobra bem menos!".
Coisas assim são como pequenas lâminas que cortam seu corpo, incomodam e ardem, mas não ferem a ponto de causarem risco de vida. Se me fizessem a pergunta do começo desse devaneio, eu responderia que ser tolhido na sua própria arte irrita, incomoda e fere. Enquanto escrevo, relembro de alguns momentos que poderiam ter dado registros incríveis e foram apenas protocolares, porque como profissionais, temos que atender o desejo do cliente e o propósito daquele trabalho.
Ainda que eu estivesse no lugar errado, me sujeitando a essas pequenas doses de veneno, aprendi muito sobre a técnica fotográfica e principalmente como lidar com o outro e com minha própria irritabilidade.
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Rods Aguiar - Fotógrafo
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